Não é simples entender por que no Brasil não há cultura de denúncia. A verdade é que temas como esse trazem o estigma de que o denunciante é traidor, dedo-duro ou X9, mesmo quando está a favor da ética e do combate à corrupção. O longo caminho que nosso país ainda tem que percorrer na defesa dos direitos humanos é uma forte barreira cultural.
Dessa forma, o direito de cada um ainda fica em segundo lugar, quando aprendemos que entregar alguém, apontar algo errado ou trair a confiança de nosso confidente é algo abominável. Mas não é.
Historicamente, a delação no Brasil também se relaciona negativamente com a vantagem pessoal, a denúncia como benefício próprio, como vantagem ou, ainda, para “salvar a própria pele”, como foi o caso de Joaquim Silvério Reis, o odiado delator da Inconfidência Mineira.
Também não é possível falar sobre a barreira histórica da inexistência da cultura de denúncias sem lembrar da ditadura militar no Brasil, um regime de natureza nefasta, que, ao pretexto de sufocar um suposto golpe político, suspendeu os direitos civis de toda uma nação e submeteu aqueles que resistiram a torturas em busca da delação de organismos de resistência ao regime ou de compatriotas dedicados àquela causa.
Por fim, mas sem nenhuma pretensão de finalizar o assunto, acredito que a liberdade de imprensa, ou a falta dela, também teve, e talvez ainda tenha, uma forte influência no tema. O medo de represálias é uma das principais razões para as pessoas não denunciarem – ou seja, defender o seu direito ou da comunidade, falar a verdade, desmascarar o infrator e, muitas vezes, o criminoso –, por ser algo visto como muito perigoso.
Mas será que esse “medo” procede?
Creio que sim. Apesar dos enormes avanços deste tema no Brasil nas últimas décadas, ainda temos muito para evoluir. Apenas como exemplo, a liberdade de imprensa e do direito das pessoas se manifestarem não está nos níveis que deveriam estar, principalmente quando somos comparados a outros países no mundo.
Segundo o Ranking Mundial de Liberdade de Imprensa, da ONG Internacional Repórteres sem Fronteiras, publicado em abril de 2021, o Brasil caiu pelo 4º ano consecutivo na classificação mundial de liberdade de imprensa, ocupando hoje a 111ª posição entre os 180 países ranqueados.
É mais do que hora de trabalharmos nessa cultura de não denunciar que enfrentamos hoje. Precisamos acima de tudo dar o exemplo de comportamento ético e assegurar canais eficientes para a realização de denúncias, assim como garantir a segurança necessária ao denunciante, de modo a não sofrer represálias ou sanções por ter tido a atitude de relatar irregularidades que eram do seu conhecimento.
As organizações, por sua vez, precisam tratar com bastante atenção cada denúncia recebida, de forma a investigá-la e punir o eventual desvio de conduta, afastando, assim, qualquer percepção ou sensação de impunidade.
“O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética… O que me preocupa é o silêncio dos bons.” Martin Luther King Jr.
Por Oswaldo Basile, CEO da Trusty Consultores e representante exclusivo da Resguarda do Brasil.